Coração ligado, beat acelerado

Ela é a pessoa mais volúvel que eu conheço. Ela não sossega, fica olhando pros lados, sem saber ainda se quer ser toda má Betty Davis, ou Audrey tomando sorvete em Roma. Quando anda nas ruas vai pensando na cena do filme ruim brasileiro que viu, a cena era boa, a moça muito descolê num balanço no meio de seu loft-estúdio de pé-direito muito alto, balançando e falando pro mocinho recém-reencontrado – paquera de adolescência, década e meia depois -, contando que foi voluntária na África, depois modelo em Nova Iorque, cansou e foi pra Paris e agora é artista aqui, aí dá impulso e abraça o rapaz com as pernas, se pendura nele, uma cena bonita. Ela pensa em quem queria abraçar com as pernas e quase não consegue contar todos mas também quase não tem perna pro melhor de todos, dá-se um jeito, polvo em polvorosa. Ela dá um gole na vodka e lembra de novo que nos filmes as pessoas bebem pouco, o truque da sedução envolve sempre um copo meio cheio, melhor assim, prefere beber pouco. Ela enumera de memória as histórias que tem pra contar reprimindo a vontade repentina de se passar por outra.