Timing

Meu ônibus não passa na sua rua mas passa na esquina da. Será ainda a sua rua? Não sei, mas é ali que te imagino, te pressinto e procuro entre os pedestres desde a janela do ônibus como se conhecesse bem seu caminhar. Por muitos quarteirões durante a descida trato de adivinhar seu momento, se a vida amorosa já entrou no compasso, se o ritmo do trabalho às vezes ralenta, se as notas do seu cotidiano se afinam. Quem vê pensaria que falo de amante, mas amor mesmo só tem o que juramos fraterno e é. Intimidade tampouco temos, mas eu chegando perdida-flutuante-e-aflita não sei por quê desenhei em você certezas de porto seguro; agora a fantasia me falha com os emails não respondidos e a falta de notícias. Telefone nem pensar porque ainda me resguardo e a você também, sabe lá em que pauta pousa sua vida. Não há de ser nada porque o que quero é muito pouco. Quero sua presença tranqüila e aquele olhar de que me lembro, sempre do mesmo jeito meio sem-jeito, curioso e carinhoso. Olhar que demora.

Da série "Coisas que o dinheiro paga". II. Lixo.

– Revista Caras.
– SUV.
– Roupa vagabunda.
– Brinquedo de criança que faz barulho.
– Viagem só pra fazer compras.
– Imposto que a gente paga e nunca vê o resultado.
– Remédio pra fazer milagre (seja emagrecer, tirar cicatriz ou pôr cabelo).
– Tintura de cabelo.
– Televisão que fica ligada no máximo o tempo todo.
– Presente que compramos ou compram sem a menor consideração
– Comida super processada e cheia de corante.
– Sapato que machuca (é de morrer de raiva).
– Boate da moda pra ser mal atendido e dançar apertado.
– Produtos baratinhos e fofinhos, preferencialmente de plástico que serão jogados fora em dois segundos.
– Fast food.
– Roupa de marca com logotipo.
– Bolsa de grife (não se defenda, tenho direito a implicâncias).
– Roupa pra cachorro.
– Coisas desnecessariamente descartáveis.
 
(Esta lista exprime opiniões pessoais e mutáveis, me reservo o direito de mudar de idéia, como sempre.)
 

Da série "Coisas que o dinheiro paga". I. Luxo.

– Água de côco na geladeira.
– Manicure (embora o esmalte em si seja mau para o meio-ambiente).
– Cozinheira.
– Shows.
– Roupa de boa qualidade.
– Aquele presente que é a cara da pessoa.
– Sapato confortável.
– Hora marcada com a podóloga.
– Faxineira.
– Viagem.
– Livros.
– Móveis.
– Cinema.
– CDs ou música digital.
– Cerveja com os amigos.
– Selos para mandar cartas e livros pelo correio.
– Restaurante.
– Os eletrônicos que a gente escolheu e decidiu que precisa: laptop e câmera.
– Imprimir as melhores fotos.
– Um corte de cabelo decente.
– Chamada interurbana e internacional.
– Cachaça de Minas.
– Táxi e transporte público.
– Boneca de pano e carrinho de madeira.
– Um brinco que combina com tudo.
– Cursos de natação fotografia teatro artesanato e línguas.
– Artesanato de por onde se andou.