Alguma coisa está fora da ordem

‘Tain’t what you do, it’s the way that you do it.

Como sempre, na névoa entre ir de um lugar ao outro, entre um tem-que, um quero-muito e um será-que-dá, as palavras ficam se enroscando e fazendo cócegas nas idéias. A palavra da vez foi foco.

Ontem acordei com o pé esquerdo e fiz o que pude para focar no mau humor, mergulhar nele, já que não tinha jeito, e me emputecer com o email errado, com o diálogo idiota no gtalk, com a sacola azul voando pelos ares, com o casamento para o qual não fui convidada em 2007, com os nay-sayers, com a fumacinha que pairava sobre as outras pessoas com quem a segunda-feira não estava sendo nada gentil, com o pequeno desencontro, com tudo. No fim achei foi graça, contei pra todo mundo a história do casamento em 2007 (juro, olhei nos arquivos do gmail, nem sinal de convite) e pronto. Virou piada.

Fui a um evento. Foco no marketing, boas companhias, transfusão de bom humor, cabelo grisalho em gente nova, essas coisas. A amiga me conta no meio da conversa: “todo mundo dizia tanto que foco é indispensável que dispensei o que é múltiplo em mim, mas eu não posso ser uma coisa só, eu tenho que ser muitas”. Achei tão bonito, consolidar sendo muito.

Jantei. Foco no mais importante. Se os ingredientes faltam nos restaurantes, não dá pra pensar em comida sem pensar em gente sem casa. Olhar para o que – quem – é essencial, olhar vendo, falar e ouvir, conseguir discernir. Não devia ser difícil, e nem é, mas precisa da mente quieta, da espinha ereta, precisa de um coração pululante, precisa não distrair com o que é colorido e brilha. Precisa alinhar, afinar, sintonizar. Focar.

E aí você vai ver a falta de foco é só foco em outras coisas mesmo. Esperadas, desesperantes, o que for. Porque era mesmo o que você queria, ter foco em alguma coisa, e se distraiu além da hora do jantar. Porque passou um menino bonito ou uma menina charmosa e você deu aquela viradinha marota com a cabeça. Acontece. Pisca forte, olha o horizonte, abraça bem o seu amor e ó: foco.

Hoje melhorei, troquei de pé, tudo fluiu melhor, obrigada. Ainda vai ter um enrosco ou outro, vou ficar indignada com coisas pequenas (a fama se sustenta desde 2005, um novo tipo de recorde ou prova de que sou mesmo muito teimosa e pé-no-peito), vou cismar ou me distrair ou virar um girassol, mas as coisas entram nos eixos que-eu-sei.

Tive foco suficiente para escrever vários parágrafos sem encostar em uma caneta. Mas a foto que publicaram de mim na rede social? Fora de foco. Melhor mesmo. Foco demais às vezes não faz bem. Pergunte às formiguinhas.

Esta é antiga. Fev/2008.