“Memória é uma velha louca que guarda trapos coloridos e joga comida fora”
Austin O’Malley.

(Achado do Wolfie, devidamente exibido no blog da Stella his starlight)

Se eu passo pelo caminho, ele também passa por mim.

Mutação, fluidez.

Vamos celebrar

Que o experimento tá dando certo, que o mundo e eu somos um, que eu estou feliz, que o frio não tá exagerado, que eu tenho uma câmera digital, que eu tenho um anel de veneno, que eu tenho uma roommate carioca que me empresta coisas, que eu descobri um bom motivo para ser mais organizada, que a minha irmã tá chegando, que a minha festa de aniversário já é um sucesso uma semana antes, que o meu Natal também vai ser bárbaro, que o meu cabelo tá super comprido, que eu tô com fome mas não tô chatinha, que vim de carona pra casa e não tive que andar de salto, que eu consigo falar o que penso e já vou desaprender a apanhar calada, que eu tenho uma mãe que reza por mim de hora em hora, que eu tenho um pai que morre de saudade das minhas ligações, que eu vou ao Brasil algum dia, que eu existo.

Motivos bastantes e suficientes.

…gente que só coloca no blog textos e letras de música. Demonstra pouca criatividade, não? Mas ao mesmo tempo, é um alívio saber que todas as coisas já foram escritas, de uma forma ou de outra. Minha angústia já foi de outro e pode ser domada pela métrica.

Ando pela rua como a calça literária da crônica, cheia de frases soltas, notas musicais, beija-flores invadindo, sonhos onde pouso a página de sentir, a sorte de um amor tranqüilo, bocas de luar, a lua trêmula sobre as águas. As imagens se misturam tanto que já são ruído branco.

Carrego comigo a saudade, carrego gente, carrego preocupações, e carrego a angústia mesma de carregar tantas coisas, um peso no ombro…

De vez em quando do barulho sai algo, um reflexo de sentimento tão perfeito como se o arco tivesse tocado apenas o violino numa nota sublime, ou sai um texto, para passar o tempo, para não dizer que eu sou dessa gente que só coloca no blog…

Para a Estrela.

De repente Lóri não suportou mais e telefonou para Ulisses:

— Que é que eu faço, é de noite e eu estou viva. Estar viva está me matando aos poucos, e eu estou toda alerta no escuro.

Houve uma pausa, ela chegou a pensar que Ulisses não ouvira. Então ele disse com voz calma e apaziguante:

— Agüente.

Quando desligou o telefone, a noite estava úmida e a escuridão suave, e viver era ter um véu cobrindo os cabelos. Então com ternura aceitou estar no mistério de ser viva.

Clarice Lispector in Uma aprendizagem ou O livro dos prazeres, 19a. ed., Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1993. pp. 133-134.

Para mim.

O NASCIMENTO DO PRAZER (trecho)

O prazer nascendo dói tanto no peito que se prefere sentir a habituada dor ao insólito prazer. A alegria verdadeira não tem explicação possível, não tem a possibilidade de ser compreendida – e se parece com o início de uma perdição irrecuperável. Esse fundir-se total é insuportavelmente bom – como se a morte fosse o nosso bem maior e final, só que não é a morte, é a vida incomensurável que chega a se parecer com a grandeza da morte. Deve-se deixar inundar pela alegria aos poucos – pois é a vida nascendo. E quem não tiver força, que antes cubra cada nervo com uma película protetora, com uma película de morte para poder tolerar a vida. Essa película pode consistir em qualquer ato formal protetor, em qualquer silêncio ou em várias palavras sem sentido. Pois o prazer não é de se brincar com ele. Ele é nós.

Clarice Lispector

PS: Pode ser que esse texto não seja dela. Alguém sabe?