A Cris Guerra disse uma vez, e eu achei muito verdade:
Mas que nada
“Largou tudo para…” é uma frase bem clichê que é muito usada no jornalismo em três tipos de história: quando a pessoa resolve viver uma vida simples, quando vai trabalhar no terceiro setor, e quando decide colocar um relacionamento à frente da carreira.
Parece até que as situações anteriores (“contrárias”?) são *o certo*, *a realidade* e são vividas absolutamente sem renúncias e sacrifícios.
Nas matérias sobre vida simples, tem que enfatizar bem o “estilo de vida abastado” a que a pessoa renunciou, que é pra provar por A+B que é escolha mesmo, senão é só pobreza. “Juro, gente, ele é rico, mas escolheu viver como pobre, olha aí.”
Estou esperando ver no jornal a história de Marisa Pereira, que vivia num apartamento de dois quartos, dava aula em um projeto social e era feliz com seu marido, e “largou tudo para” trabalhar numa multinacional. Já pensou?
Ou, como disse o Marcos:
“Fulano de Tal, até dois anos atrás um bem-sucedido artesão em palha e cultivador de jilós de Conceição da Serra, largou tudo para se tornar executivo de multinacional em São Paulo. ‘Perdi em saúde e qualidade de vida, mas agora ganho muito dinheiro. Para mim, valeu a pena’, garante o ex-capiau”.
(Esse negócio de dar importância às palavras é um horror, tenho que parar com isso.)
A cidade ideal
Voltar a uma cidade e deixar que ela se emaranhe na sua vida enquanto você cria novas memórias. Quem morou todo o tempo no mesmo lugar não entende como é que pode alguém tomar amor por uma entrada de estação do metrô só porque ela fica perto do boteco onde aquela vez, aquela história. Não entende como o jardim de um prédio histórico já foi uma floresta gigante e refúgio de namorico adolescente e lugar de levar os sobrinhos e agora é caminho de vizinhança. A praça, a calçada, a loja, todos cenários de um Rio que não se visita: ele apenas é.
Se é tarde, me perdoa
Houve uma época em que os pensamentos da madrugada desaguavam diretamente aqui no blog. Tudo era motivo: um comentário do dia-a-dia, um afazer, um diálogo. Mudamos eu, a internet, o blog, até os diálogos. O comum e corrente da vida vai parar num cercadinho chamado Facebook, há mais reservas e há menos blogs, como atestam as dezenas de urls fantasmas vistas na migração do meu Google Reader para o Feedly.
Mas o que é que eu queria?
Eu queria voltar. Eu queria desenguiçar a máquina de escrever. Ainda ando envolta em palavras, fazendo cachecol delas, e um pouco contrariada com Clarice que elegeu amar como forma de salvação individual. Ok, entendo, mas as palavras, ó, as palavras, têm sido tudo o que eu respiro e faço e espero, em tantos contextos diferentes. E têm sido salvação como desde sempre eu esperava. No entanto não vêm mais aqui e nem pelos mesmos motivos.
E continuo querendo.
Quando eu morava em outros lados e ficava uma semana inteira sem um abraço se não marcasse de ver os poucos e bons mais chegados, meu sonho dourado era andar pela rua reconhecendo gentes – conhecidos, amigos – em plena cidade grande e não só na mini-cidade do campus. Eu achava que encontros fortuitos iam ser o auge do pertencer.
E estava certa.
Ainda as palavras: outro dia ri sozinha ao lembrar daquelas: “Hoy, al verlo, me di cuenta que lo nuestro no es más que una ilusión.”
E era.
Relaxa, gata!
(Este texto é da programadora Katie Cunningham e foi publicado em seu blog pessoal, The Real Katie, e no BuzzFeed. A tradução é minha. Aceito correções e revisões.)
Recentemente, me perguntaram por que uma mulher que adora programar largaria esse ofício. Sério: houve um momento da minha vida em que eu decidi que programar era algo que eu só faria em privado. Só agora estou devagar voltando ao mercado.
Eu amo programar. Faço isso desde antes da puberdade. Fazia isso quando mal tinha dinheiro pra pagar o servidor. Faço isso nos fins de semana e noites, e estou ensinando meus filhos como fazê-lo. Gastei milhares de dólares para ir a conferências para poder aprender mais. Por que eu largaria uma profissão em que sou paga para fazer o que amo?
Em resumo, eu cansei de ouvir “relaxa”.
Essa indústria carrega um machismo sutil. Eu quase prefiro machismo aberto, porque pelo menos você consegue apontá-lo. As farpas sutis são geralmente descartadas como algo com que eu não preciso me preocupar. É uma piada! Afe. Por que você é tão sensível? Eu só fiz uma piada sobre você ter que estar na cozinha!
Relaxa.
As farpas também não são sempre piadas. Às vezes, são tentativas de me empurrar para um papel tradicionalmente “feminino”. Como mulher, eu fui a única pessoa do grupo a quem pediram para organizar um lanche (supostamente, esse é um trabalho indigno para homens). Eu fui a única a quem pediram para tomar notas numa reunião
Uns dias
Naqueles dias eu tive bem mais que os 20 minutos de coragem insana daquele filme que você me contou e eu não vi.
Naqueles dias eu fui um míssil teleguiado na direção do seu nariz arrebitado.
Nos dias seguintes eu pensei que tinha que mandar fabricar uma dúzia de você para envelhecerem – todos eles – na minha adega sob os meus cuidados.
Uns outros dias eu vi você em festas em bares em fotos e fiquei feliz de ser descomparada com a rival que eu achava que tinha.
Dia sim dia não eu peço conselhos que você me dá com paciência como se nós fôssemos os dois muito sábios e vividos.
Um dia ainda me cuido ou me mando para aí.
Para ouvir: How sweet it is…
Noves fora
Nada nada.
https://www.youtube.com/watch?v=ur0UeGkTj2I
(Que me dê amor bem grande que pequeno não dá pé.)
Com que roupa eu vou?
Dizer que eu não ligo para moda é um understatement. Estou usando jeans e camiseta desde que me entendo por gente, com uma breve incursão pelas saias indianas na época da faculdade e, antes disso, uma estranha mania por coletes no início dos anos 90.
Ultimamente tenho tentado ficar um pouco menos preconceituosa, afinal, o mundo da moda é uma indústria enorme e que tem seus próprios meandros e méritos, como aprendi naquele discurso da Meryl Streep em O Diabo Veste Prada.
Mesmo assim, com a coisa de simplificar a vida, tenho pensado muito em um guarda-roupa minimalista. Eu acho de verdade que se eu tivesse ainda menos roupas minha vida seria mais fácil. Fui pesquisar e descobri que não estou só. Aqui vai uma lista de alguns conceitos e projetos que me chamaram a atenção.
O conceito veio da Susie Faux, dona da loja londrina Wardrobe, nos anos 70. Em 85, Donna Karan retomou a ideia com uma coleção chamada “7 easy pieces”. Nessa coleção, as modelos usavam collants pretos e leggings sobre os quais iam sobrepondo as outras peças. Desde então, outras marcas têm lançado mini-coleções em que todas as roupas combinam entre si.
A designer Sheena Matheiken decidiu, como um desafio de criatividade e sustentabilidade, usar só um vestido por 365 dias. Na verdade era mais de um vestido (porque ela precisava lavar), o vestido era muito versátil e ela tinha muitos acessórios, possibilitando inúmeras combinações. Ela fotografou todos os looks e convidou os leitores do blog a doar dinheiro e acessórios que depois foram revertidos em prol de uma instituição beneficente indiana. Ela falou no TEDxDubai sobre o projeto, que estreou em 2009.
Este projeto nasceu como um post despretensioso num blog e acabou de fazer 3 anos agora em outubro. A Courtney Carver tinha um blog de simplicidade e se propôs a vestir apenas 33 peças por 3 meses – ela vai renovando o guarda-roupa ao longo do ano. Esses 33 itens incluem roupas, acessórios, joias, agasalhos e sapatos. Não contam: joias tipo aliança ou algo que você nunca tira, lingerie, camisolas, roupa de ficar em casa e roupa de exercícios (mas só vale pra fazer exercício). Todo o resto deve ser guardado fora de alcance.
O bacana do 333 é que ele é muito aberto, cada um pode tentar ao seu jeito e modificar um pouco as regras.
Este projeto começou com as loiríssimas Heidi Hackemer e Tamsi Davies. O site delas já saiu do ar, mas o link acima leva para um vídeo de uma matéria do NYTimes. Pelo que eu entendi o site tinha uma pegada colaborativa, onde as pessoas podiam criar usuários e ir blogando sobre a experiência. A regra era: seis roupas por um mês, sem contar sapatos, lingerie e acessórios. Podia ter roupas repetidas para lavar, mas tinham que ser do mesmo modelo e cor das outras, senão contavam como peças extra.
Segundo a Heidi, os motivos para as pessoas embarcarem no projeto eram dos mais variados, desde anti-consumismo e controle de despesas até desafios criativos e o eu-não-ligo-para-moda. Ela menciona no vídeo que ficou chocada de as pessoas não perceberem que ela estava vestindo as mesmas roupas de novo e de novo.
Parece inspiradíssimo no projeto Six Items or Less, mas com uma pegada muito mais religiosa-ativista focada em compaixão e justiça social. Quem comanda o site é uma organização inglesa sem fins lucrativos, e o projeto funciona em épocas específicas: o próximo desafio está marcado para a quaresma de 2014. Como é um blog colaborativo, tem de tudo, as fotos não são tão bacanas quanto as dos outros projetos, e algumas pessoas não parecem tão ligadas em moda. Para cada participante, há uma página de doações para a ONG, que milita pelos direitos dos trabalhadores da indústria têxtil.
A Jennifer Scott é autora de uma coluna no Huffington Post, um blog e um livro onde ela conta a história de como ela aprendeu a ser chique em Paris. Ela foi para lá adolescente para um intercâmbio, e na casa onde ficou o armário era infinitamente menor que a quantidade de roupas que tinha levado.
Ela seleciona 10 peças por estação – sapatos e casacos pesados não contam. A filosofia da Jennifer – aprendida da Mme Chic – é que tem que estar sempre arrumadinha, não importando se é pra ir na esquina ou ficar em casa. Se você tiver só suas peças favoritas, vai estar sempre bem vestida.
Dos blogs brasileiros que eu achei parecidos com esses projetos, se destacam o Um ano sem Zara e o Oficina de Estilo. O primeiro foi um esforço da blogueira para chegar na conta bancária “em azul” por não comprar roupas por um ano. O segundo é de consultoras de moda que acreditam no lema “menos é mais”.
E falando em menos, tem o blog menos da Claudia Regina que, mesmo rejeitando o adjetivo “minimalista”, vive com um guarda-roupa ínfimo – e esse eu vi em primeira mão!
É claro que quem se dispõe a participar num desses desafios sabe onde o calo aperta. Tem gente que trabalha em casa e não precisa mesmo de tanta roupa, tem gente que mora em lugar quente e teria que botar a lavanderia para funcionar a full, tem quem realmente não consegue ficar sem mil opções. De qualquer maneira, é interessante observar que ter tudo ao mesmo tempo agora não precisa ser o padrão.
Se até o Obama conseguiu simplificar, quem não consegue?
Um belo dia eu resolvi mudar
Há quanto tempo você não muda? Empacota tudo, endereço novo, casa nova, caixas, caminhão, desempacota tudo, reorganiza
Bituca e Guimba não podem ir à praia
Não, eles não são compositores de samba-enredo. Bituca e guimba são duas palavras (até bonitinhas!) para designar o filtro de um cigarro fumado (nada bonitinho).
http://www.flickr.com/photos/marknye/6786503492/sizes/z/
Confesso que não participo da tentativa de demonização dos fumantes. Sei que cigarro faz mal, mas tenho cá minhas simpatias por um ou outro fumante mais charmoso. O que acaba mesmo com qualquer boa-vontade da minha parte é ver alguém jogando bituca no chão. São bilhões de pedacinhos aparentemente inofensivos de acetato de celulose descartados inadequadamente ao redor do mundo a cada ano. Além de enfeiar a cidade e as praias, as bitucas terminam, quase invariavelmente, nos rios e oceanos. Cada guimba contamina aproximadamente 8 litros de água, matando microorganismos, e animais maiores são fatalmente enganados pelas supostas minhoquinhas.
É um problema fácil de resolver: não jogue as guimbas no chão, oras. As lixeiras urbanas em geral têm uma placa de metal onde o cigarro pode ser apagado antes de ser descartado. Uma alternativa um pouco mais trabalhosa é carregar seu próprio cinzeiro portátil, que pode ser um tubo de filme fotográfico, um estojinho de fio-dental, este cinzeiro lindo da Zippo ou esta caixinha australiana que faz piada visual com a palavra em inglês para guimba,butt (bumbum). E esses dias vi duas garotas apagarem os cigarros de um jeito inusitado: apertando a parte próxima ao filtro para expulsar a brasinha (para não ter que apagar o cigarro contra uma superfície) e carregando a bituca por mais alguns passos até achar uma lixeira.
Minha curiosidade é saber se o bom exemplo e a aura cool das pessoas que têm consideração para com o meio-ambiente e a limpeza urbana vão ser tão contagiosos quanto o foram, cada um a seu tempo, o tabagismo e o anti-tabagismo. O que você acha?
Publicado originalmente em 27.5.08 no meu extinto blog Simplim. “Simplicidade voluntária, vida simples, descomplicações e urbanidades. Para tribos diversas e enfoques variados.”