Broder, me dei conta de que agora fez um tempo e a gente não se vê mais. Eu te maldisse mil vezes e de todas as minhas histórias a nossa foi a mais estranha: curta, clandestina, errática, cheia de falhas de comunicação, a maior concentração de filhadaputice por metro quadrado e aquela música que ficou pra sempre entalada na memória. Você me oferecia bebida como se achasse que eu não ia dar pra você (eu ia), você curtia o segredo como se eu precisasse dele (não precisava), você fingia que não fazia muita questão (fazia). Até o final foi esquisito, todo errado. Mas broder, cê lembra como era bom?
Não dormia nua
Você me disse assim: “você nunca mais ficou nua no blog”. E eu disse: “é verdade”. Do mesmo jeito que nunca mais me apaixonei como aos vinte anos, nunca mais derreti no chuveiro, nunca mais romance, nunca mais cinema, nunca mais drink no dance. Tal qual uma Sasha sexy cujas sacanagens se alfabetizaram em inglês, nunca mais achei a tradução de small of the back para ser gentilmente conduzida assim pelo small of the back para fora de um restaurante ou para dentro de um tesão incubado qualquer.
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Tem tempos e tempos. Tempos de mesa de bar, tempos de chão da sala, tempo de cama. Casa, rua, a gente vai zanzando de acordo com a cabeça e a conjuntura. Andamos agora de casa, eu e vocês. Entrando e saindo de nossas casas, discutindo detalhes – sórdidos, inclusive – tomando café. É uma intimidade não esperada para esta cidade, para estas pessoas, para nós. Ninguém nos acredita, inocentes não somos – jamais.
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Perna bamba e coração mole. Você insiste: “escreve, escreve mais contos safados para mocinhas que já vêm molhadas”. E eu: “não, não posso!”. Na falta de enredo, só imagens: gesto de menina, nas mãos muitos dedos, nos dedos muitos anéis. O olhar de senhorinha por sobre os óculos, toda ela criança. Quem diria que eu de novo ia encontrar santo menino que velho respeita? Velha, no caso, eu. O jeito que ela tira os óculos no escuro já no último minuto antes de partir pro ataque, o tanto de badulaque no corpo, a moleza, a pegada, hippie cigana agênera com sotaque fazendo o número do violão e um tanto de trocadilho ruim. Se alguém pegar a bola de cristal e disser que a gente nunca mais se vê, sai: chôro sentido e texto bom. Se me disser a mesma bruxa que a gente se vê por aí, a cada tanto, em cantos escuros lá e cá, acredito piamente também. O sea, resumiendo, estoy jodida y radiante, quizás más lo primero que lo segundo y también viceversa.
Mais um artigo sobre uma montoeira de coisas.
Será que os americanos estão comprando muito? Esta é a pergunta idiota do dia, feita pelo The Guardian.
Mas se a pergunta é boba, por que não nos questionamos ainda aqui no Brasil?
Lá pras tantas o texto da matéria diz que (tô parafraseando) quando você compra coisas novas, o custo não é só grana. Custa dinheiro, custa o tempo que você levou pra ganhar esse dinheiro, custa espaço na sua casa, e custa o tempo de limpar e manter tudo. E custa planeta, sim sinhô e sim sinhóra. Além, claro, de um stress danado quando você olha prum armário cheio e não tem nada pra vestir.
Tá sobrando cacareco. A solução é menos. #tãosimples
Ah, por favor, não vem me explicar
Cá no inbox, uma amiga cientista pergunta: “Qual será a proporção de homens e mulheres que são contraditos ou duvidados quando falam sobre sua especialidade por alguém (quase sempre um homem) que não é nem especialista na mesma area? Pense num ódio…”
Lá nos EUA, uma vez um professor do Dan (meu ex, que estudava filosofia da física) estava conversando com ele no almoço, propondo um thought experiment de relatividade especial – nave a, nave b, fio inextensível, etc. E eu do lado prestando atenção. Lá pras tantas o professor me pergunta “am I boring you yet, honey?”. O Dan rapidamente corrigiu o cara dizendo que eu tinha graduação e mestrado em física, e o cara só disse “ah, isso são dois diplomas a mais que eu”, deu de ombros e continuou sem pedir nem desculpa nem expressar embaraço.
Moral da história? Não seja esse cara. Por favor, não seja esse cara.
A pequena casa dos sonhos
treehugger.com/green-architecture/your-tiny-dream-home.html
Postei estes dias lá na Grande Rede Social uma notícia de 3 anos atrás sobre o concurso de design para os micro-apartamentos de NY. A planta que aparece na notícia é bem parecida com a do meu apartamento e é exatamente do mesmo tamanho.
“As pessoas estão sacando que morar em lugares pequenos é uma escolha, não é um castigo. As pessoas querem tamanhos gerenciáveis, que requerem manutenção mínima, com consumo de energia decente e aluguel razoável.
Todo mundo quer morar num refúgio de paz, não numa fonte de stress. Todo mundo quer casas que fazem sentido financeiramente, em relação ao meio ambiente, e de acordo com o bom e velho bom-senso.
Este movimento trazer um futuro em que as nossas casas vão apoiar nossas vidas, em vez de simplesmente ter uma vida que sustente nossas casas.”
Beija eu
Mais um capítulo do Manual de Etiqueta Amorosa e Sexual do Canalha Gentil e da Safada de Fino Trato, a ser escrito por esta que vos fala assim que sobrar um tempinho:
A hora certa de conversar sobre monogamia e relacionamentos abertos, sobre disposições emocionais várias ou sobre a tara esquisita que te faz cantar o Hino da Bandeira na hora do orgasmo (pátria, filhos e mãe gentil na mesma frase) é – presta bastante atenção! – naquele intervalo de tempo depois de beijar e antes de tirar a roupa.
Antes do beijo esses assuntos podem ser um ótimo quebra-gelo mas o investimento na situação é baixo demais e as pessoas podem deixar de se permitir algo que nem é tão ruim assim.
Depois de tirar a roupa já é quase uma traição, uma propaganda enganosa, um descombinado se infiltrando ali onde não devia.
É muito ruim comprar gato por lebre, mas dá uma olhada nesse gato de novo, vai…
Para ouvir: Esqueça o que te disseram sobre o amor
Mistério do planeta
A Cris Guerra disse uma vez, e eu achei muito verdade:
“Fique atento, filho: quando acontece de encontrar a cada dia mais mundos com alguém, costuma ser amor.”
São amigos, tradições, famílias, hábitos e manias que emprestamos uns aos outros, são planetas e galáxias que formamos juntos aqui e ali. O difícil nesta vida é resistir à tentação de comprar o mundo do outro de porteira fechada, sem questionar, sem misturar direito, sem botar uns elementos nossos no contraponto e sem se reexaminar de quando em vez. A gravidade puxa pra dentro e a gente acaba se misturando tanto a ponto de acharem que a gente é dali. De a gente achar que é dali.
Aí quando os planetas implodem a gente fica despatriado. A gente sai de um mundo pro outro sem nada na bagagem, ou com um ou outro souvenir intergaláctico. E se vê tão tão afastado da Terra que o único que resta é flutuar vagarosamente no espaço em caminho de volta e fazer do voo o mais agradável possível.
Mas que nada
“Largou tudo para…” é uma frase bem clichê que é muito usada no jornalismo em três tipos de história: quando a pessoa resolve viver uma vida simples, quando vai trabalhar no terceiro setor, e quando decide colocar um relacionamento à frente da carreira.
Parece até que as situações anteriores (“contrárias”?) são *o certo*, *a realidade* e são vividas absolutamente sem renúncias e sacrifícios.
Nas matérias sobre vida simples, tem que enfatizar bem o “estilo de vida abastado” a que a pessoa renunciou, que é pra provar por A+B que é escolha mesmo, senão é só pobreza. “Juro, gente, ele é rico, mas escolheu viver como pobre, olha aí.”
Estou esperando ver no jornal a história de Marisa Pereira, que vivia num apartamento de dois quartos, dava aula em um projeto social e era feliz com seu marido, e “largou tudo para” trabalhar numa multinacional. Já pensou?
Ou, como disse o Marcos:
“Fulano de Tal, até dois anos atrás um bem-sucedido artesão em palha e cultivador de jilós de Conceição da Serra, largou tudo para se tornar executivo de multinacional em São Paulo. ‘Perdi em saúde e qualidade de vida, mas agora ganho muito dinheiro. Para mim, valeu a pena’, garante o ex-capiau”.
(Esse negócio de dar importância às palavras é um horror, tenho que parar com isso.)
A cidade ideal
Voltar a uma cidade e deixar que ela se emaranhe na sua vida enquanto você cria novas memórias. Quem morou todo o tempo no mesmo lugar não entende como é que pode alguém tomar amor por uma entrada de estação do metrô só porque ela fica perto do boteco onde aquela vez, aquela história. Não entende como o jardim de um prédio histórico já foi uma floresta gigante e refúgio de namorico adolescente e lugar de levar os sobrinhos e agora é caminho de vizinhança. A praça, a calçada, a loja, todos cenários de um Rio que não se visita: ele apenas é.
Se é tarde, me perdoa
Houve uma época em que os pensamentos da madrugada desaguavam diretamente aqui no blog. Tudo era motivo: um comentário do dia-a-dia, um afazer, um diálogo. Mudamos eu, a internet, o blog, até os diálogos. O comum e corrente da vida vai parar num cercadinho chamado Facebook, há mais reservas e há menos blogs, como atestam as dezenas de urls fantasmas vistas na migração do meu Google Reader para o Feedly.
Mas o que é que eu queria?
Eu queria voltar. Eu queria desenguiçar a máquina de escrever. Ainda ando envolta em palavras, fazendo cachecol delas, e um pouco contrariada com Clarice que elegeu amar como forma de salvação individual. Ok, entendo, mas as palavras, ó, as palavras, têm sido tudo o que eu respiro e faço e espero, em tantos contextos diferentes. E têm sido salvação como desde sempre eu esperava. No entanto não vêm mais aqui e nem pelos mesmos motivos.
E continuo querendo.
Quando eu morava em outros lados e ficava uma semana inteira sem um abraço se não marcasse de ver os poucos e bons mais chegados, meu sonho dourado era andar pela rua reconhecendo gentes – conhecidos, amigos – em plena cidade grande e não só na mini-cidade do campus. Eu achava que encontros fortuitos iam ser o auge do pertencer.
E estava certa.
Ainda as palavras: outro dia ri sozinha ao lembrar daquelas: “Hoy, al verlo, me di cuenta que lo nuestro no es más que una ilusión.”
E era.