We can play it safe, or play it cool

It’s a funny way, to make ends meet,
when the lights are out on every street,
It feels alright, but never complete,
without you,
(…)
We can play it safe, or play it cool,
follow the leader, or make up all the rules,
whatever you want, the choice is yours,
So choose.

Faz uns cem anos eu levava palavras pra passear e há quinhentos me enrolava nelas. De duas semanas pra cá são vinte cafés e achar o caminho com o nariz pelas ruas do centro, farejando esquinas de portas pequenas e namorando a loja da Alfândega que afinal comprei inteira com todos os temperos.

Venho esbarrando nos homens de terno que não são tão bonitos aqui como lá e pensando em coisas verdes, amarelas, magrelas, morenas, deliciosas, cantando no metrô para espanto certo dos transeuntes, ouvindo cantadas gaiatas ditas sem baba na boca e fazendo ouvidos de mercador na rua do ouvidor.

Seguir horários é mais fácil do que eu pensava, tudo me obedece até o estômago até o sono, consigo não ser inconveniente nem inconveniada na gritaria dos cor-de-rosa e estudar betume e soja com desenvoltura.

Mais ainda, meus estrangeiros agora vêm de perto e passeiam por ruínas da cidade, passeiam pelo chiquê dos restaurantes, até em borboletários se metem e eu atravesso incólume quase sem que as borboletas me toquem o estômago, orgulho de mim, intrépida. Não sei muito bem o que fazer com as crianças, bichinhos esquisitos.

Agora o barulho da máquina de escrever me lembrou daquela pasta de manuscritos guardada embaixo do colchão, não sei se um dia a resgato. Lembro de passagens em que a jovem se perguntava se um dia ia conseguir como se dar inteira sem rasgar pela metade ou algo assim, uma bobagem romântica, e eu cartesianamente descubro que é sempre metade que vai, sempre um pedaço pequeno, uma isca, esperando resgatar um todo que nunca chega.

Reconhecer incompletude incomoda mais que comer borboleta, mais que tropeçar em pedra portuguesa.

Vai ver estão certos, sou um pouco doida.