Vim pra universidade a pé xingando tudo o que vi pela frente.

Tem neve ainda na rua, mas agora que começou a derreter um pouco tem um monte de gelo. E com a chuvinha que está caindo, o gelo fica difícil de ver. Resultado: as calçadas parecem rinques de patinação. Deus me livre de manter as calçadas seguras tal que as pessoas possam andar, só onde passam os carros é que tem que ser bacana, claro.

A situação é ridícula: você está andando, sente que não dá pra passar porque escorrega. Se tiver neve perto, beleza, pisa-se na neve. Senão, tem que olhar em volta e ver se tem algum lugar sem gelo. Às vezes não tem, e você fica ilhado. Aí a solução é dar uns passinhos ridículos de dez centímetros e rezar para não cair (ou para ter uma queda sem muita dor e sem testemunhas).

E neguinho reclama do calor. Não me conformo!!!

Professor Paulo Rosa, meu melhor professor de português:

E, ainda que o adulto não passe de uma criança que deve dinheiro, a vida nos proporciona uns momentos bem interessantes. A vida é uma espécie de mão que afaga e apedreja; o choro é véspera do sorriso; a alegria de anteontem escorreu pelos dedos de agora. Viver dá o maior trabalho. E a vida foge a nossa definição como fugiria das nossas mãos um pássaro. Talvez um beija-flor (desses que brotam no pátio do Sion como borboletas azulzonas ou aquele monte de avencas). Apesar de parecer um pássaro sem asas, o beija-flor faz o movimento de abrir e fechar de asas típico dos pássaros. Para cada vez que fecha, tem uma vez que abre. E eu vejo vocês agora, no exato e silencioso instante entre o abrir e fechar. O momento em que beija-flor finge que parou de bater as asas, num capricho quase feminino.

Estejam à vontade, que o abrir de asas de hoje não é o primeiro nem o fechar será o último. Haverá muitas outras vezes: um com nome de monografia de fim de curso, outro com nome de primeiro emprego, outro com nome de mestrado, outro com nome de defesa de tese…

Estejam bem à vontade, sabendo que todo fim, no fundo no fundo, não passa de um começo que ainda não ganhou forma.

Eu sei que eu não sou a melhor pessoa do mundo, nem a mais legal, mas é fato: eu costumo gostar das pessoas. De vez em quando sou ranheta, mas em geral eu não tenho muitas implicâncias.

É por isso que eu me sinto estranha quando não gosto de alguém. Fico sempre achando que é loucura minha, principalmente em relações profissionais.

PS: Este post veio incompleto, por bobeira minha. O que eu ia contar mesmo, cheia de gosto, é que eu me sinto muuuuito bem quando alguém vem me dizer cobras e lagartos sobre a pessoa de quem não gosto. É bom pra eu me dar conta de que não estou de implicância, a pessoa é dura de roer mesmo!!

Eu tô com a Zizi Possi bem dramática na minha cabeça cantando chorosa o Lupicínio Rodrigues…

Nunca,

nem que o mundo caia sobre mim

nem se Deus mandar nem mesmo assim

as pazes contigo eu farei


Mas como diz a Mõe, não se diz dessa água não beberei…

Que eu sou ruim, sou. Ou boa, vai saber. Desisti em insistir nas amizades que dão muito trabalho. E tenho dito.

Não é surdo-mudo, é surdo, porque um surdo pode falar ainda que não escute.

Não é aeromoça, é comissária de bordo, especialmente treinada para garantir a segurança dos passageiros e da tripulação.

Não é stewardess, é flight attendant.

Não é homossexualismo, é homossexualidade, porque “ismo” quase sempre se usa pra doenças e isso não tem nada de doença.

Não é hermafrodita, é intersexual, porque hermafrodita dá a idéia de uma pessoa que tem duas genitálias distintas e completas, o que não é quase nunca verdade.

Não é o médico nem a doula que “delivers babies”, quem “delivers a baby” é a mãe. Médicos e doulas “catch babies”.

Não é guia lá no museu, é educador, porque museu não é turismo.

Não é doar um cão ou um gato, é dar para adoção, porque são seres vivos.

Não é judiar, porque a gente não tem nada contra os judeus.

Não é mulata, porque negros não têm cor de mula.

Não atire o pau no gato-to porque o gato-to é nosso amigo-go.

Não é espanhol, é castelhano, porque essa língua é da Castelha e não de toda a Espanha, que também tem o basco e o catalão.

Estes são apenas alguns dos termos politicamente corretos que eu tenho aprendido. Alguns eu faço questão de usar e chamar a atenção das pessoas (como o “surdo”, por exemplo, que até já é incorreto…) mas outros por aí eu acho um exagero completo, como mulata ser palavrão.

Mas vai ficando cada vez mais difícil falar sem cometer escorregões…

De novo, Buenos Aires, Janaína Figueiredo:



Publicado em 15 de janeiro de 2004

TEATRO

O sucessodas paródias

Enrique Pinti é um dos melhores atores cômicos da Argentina. Suas peças são sempre um sucesso. A especialidade de Pinti é a realidade argentina. Todos os anos o ator monta uma peça nova, sempre inspirada no jeito de ser dos argentinos e nos acontecimentos mais importantes dos últimos tempos. Seus monólogos são únicos, divertidíssimos. Atualmente, ele está em cartaz com a peça

Os filhos

Kahlil Gibran

Seus filhos não são seus filhos.

Mas sim filhos e filhas do anseio da Vida por si mesma.

Eles vêm por meio de vocês, mas não provém de vocês.

E embora estejam com vocês, não lhes pertencem.

Vocês podem lhes dar seu amor, mas não seus pensamentos,

Pois eles têm pensamentos próprios.

Podem abrigar seus corpos, mas não suas almas,

Pois as almas deles residem na morada do amanhã, que vocês não podem visitar nem mesmo em sonhos.

Vocês podem se esforçar por ser como eles, mas não busquem moldá-los à sua própria imagem.

Pois a vida não retrocede, nem se demora no ontem.

Vocês são os arcos dos quais seus filhos são lançados como flechas vivas.

O Arqueiro divisa o alvo na trilha do infinito, e retesa o arco por Seu poder para que Suas flechas possam seguir rápidas e voar longe.

Que vocês cedam de bom grado à mão do Arqueiro;

Pois da mesma forma que Ele ama a flecha que voa, ama também o arco que fica.

Olha o livro que eu comprei. Comprei em espanhol, porque pensei que não o encontraria em português…