Maçaneta.

Todas as maçanetas aqui são colocadas de cabeça pra baixo. A maçaneta embaixo, o buraco da fechadura logo acima, a chave entra com a serrinha pra cima, para abrir você gira no sentido do batente, para fechar gira no sentido contrário.

Quatro anos e ainda não me acostumei.

Da nota de mil

Não vou viver com ninguém. Viverei com o Catete, o Largo do Machado, a Praia de Botafogo e a do Flamengo, não falo das pessoas que lá moram, mas das ruas, das casas, dos chafarizes e das lojas. Há lá coisas esquisitas, mas sei eu se venho achar em Andaraí uma casa de pernas para o ar, por exemplo? Contentemo-nos do que sabemos. Lá os meus pés andam por si. Há ali coisas petrificadas e pessoas imortais (…)

Machado de Assis, “Esaú e Jacó”

Mínimas

– Estão voltando meus superpoderes.
– Agora que meu único meio de comunicação é o email, eu checo a cada 15 segundos quando estou no computador. Quando estou longe do computador consigo mais ou menos manter a compostura.
– Uma garoa fina que só dá vontade de dormir.
– Engraçado ver as pessoas aqui pronunciando "Domingator Cinemator"!

Ou o meu msn, ou o meu yahoo messenger, ou o meu google talk…

Não me condenem por obscura

Mas…

O deus mudança me mostrou o prazo de validade das coisas. Querer por capricho é mau. Interromper o que se gosta por auto-disciplina nunca foi o meu forte.

Dá cá uma garrafa e promete, por favor, que aberta soltará todos os cheiros, diálogos, afagos, barulhos e a cor. Só por um instante. Ben Harper na vitrola, please?

Logun-edé sumiu pros lados da África, bem escondido. Achei agora um canto de Oxum, flagras fáceis da origem do mito.

O meu blog, estas palavras loucas que ninguém vai entender, às vezes me lembra – só eu com a chave das palavras – daquela faísca no escuro.

A ver se os fantasmas voltam para pelo menos dar notícias. A esperança da bruxa é que, na véspera do seu dia, o canto no meio da madrugada possa evocar o fantasma estranhamente querido.

Oi, Vó.

Entrei no metrô cansada. Linha laranja, linha vermelha, linha verde. Na linha verde olho, olho de novo. Vó Totônia. Os mesmos cabelos, castanho-esbranquiçados, descendo pelas costas num coque que desmanchou. Os mesmos olhos, o mesmo jeito de olhar que a gente vê nas fotos. A saia reta até a canela, o casaquinho por cima da blusa, meias e chinelos de couro. Ainda bem, se eu visse havaianas amarelas ia morrer do coração. Eu já estava ali, com o olhinho raso, tentando não encarar, ela puxa os óculos de leitura e começa a ler jornal. Tinha que ser jornal? Tinha. Tinha que ser o Washington Post com uma foto sem mais tamanho do Einstein na contracapa que estava virada pra mim. Comecei a chorar que nem uma doida. Chegou minha estação, desci, ela desceu, estava andando logo atrás de mim, apertei um pouco o passo, chorando, olhando para trás de vez em quando, vencendo a vontade de falar com ela, falar o quê, meu Deus? “você parece a minha avó!”? Fui para a saída oeste, ela também veio caminhando devagar, cheguei à rua, soluçava, fingi que esperava um carro para vê-la ir na direção do ponto de ônibus. Andei mais, solucei mais, enxuguei os olhos, passou.
Hoje eu vi minha avó no metrô.