Que diferença da mulher o homem tem?

Comecei dizendo que não queria ser mulherzinha e depois decidi que não queria ser machinho. Carece examinar com cuidado meus cromossomos comportamentais ou buscar no meu corpo o equilíbrio, Logunedé amazona.

O blog, por exemplo, é feminino do título às entrelinhas, passando pelas eventuais crises hormonais. Rola muito forte uma parada The Hours, onde as mulheres são seres borbulhantes nas profundezas e os homens, maridos-filhos, só vêem a superfície, “não sei de onde veio isso, ela enlouqueceu”.

Reli vários novembros. Percebi que este é mesmo o mês da retrospectiva. E das paixonites. Flores, amores, rancores, calores, dores, primaveras, outonos, temores, enganos. Algumas das paixões vingaram, outras não, outras vão. Também fui ridícula. Sem saber e também, feito agora, sabendo, fui ridícula no sim e no não.

Os nãos foram poucos, porque nunca entendi quem diz esse “não” preventivo, quem interrompe uma história feito quem sai do cinema. O sexo é bom, a conversa rendeu, e você de repente pára tudo e diz “vai dar merda, paramos aqui”? Isso me parece muito feminino e entendo que confunda os homens. Já vi essa bolsa de valores sendo operada por gente muito inteligente e muito estúpida, mas até agora em geral comprei na alta e vendi na baixa por não saber dizer chega.

Com ciclos dentro de ciclos fica mais óbvio que em algum momento vou ter que me despedir na cabeça de uma história que nem começou. Quando isso acontecer, vou morrer de pena, vou escrever cafona, vou chorar de birra, vou deixar a porta aberta e vou partir feito macho.

Para ouvir: How do I let a good man down?

Bancate ese defecto

no es culpa tuya si la nariz no hace juego en tu cara.

Querida,

está na hora de você seguir o rumo que esse seu nariz aponta e viver a vida cheia de vida que você merece.

Relutei em escrever, porque tantas vezes antes ouvi suas reclamações sobre seu relacionamento e tudo mais, tantas vezes te apoiei no seu trabalho e fui ignorada, que já não sei se de fato as coisas não estão bem ou se as confidências só servem para me manter perto quando você assim o quer.

Pois desta vez as minhas tripas te ouviram diferente, embora o cérebro ainda ache que você não sabe bem aonde vai. A energia que eu te via gastando para manter as coisas no que você acha que são seus devidos lugares agora parece que vai partir em flecha para causar mudança. Como te disse ontem, adoro te ver preparando a revolução.

Claro que digo isso em interesse próprio. Adoraria te ver mais solta pelo Rio e pelo mundo, te apresentar às pessoas, conversar olhando seus olhos e não manter essa puta amizade epistolar. No mundo em que eu vivo há espaço para pessoas cativadas e cativantes mas não para gente em cativeiro, mesmo conformadas. Queria que você visse o lado de cá.

Se dói mudar? Tive a pele arrancada a cada nova vida e não me arrependo de quase nada. Se tivesse sido fácil não estaria aqui, inventando conselhos fictícios para seu personagem fictício. Espero que dê tudo certo e que você conte comigo mesmo que saia em carne viva disso aí.

Cuide-se. Boa sorte. Eu te amo desde a época em que não gostava de você.

H.

Gosto de

suco de laranja
rede de dormir
café
wasabi
banho demorado
strogonoff
filme da audrey
chocolate muito amargo
internet
fotos
água de coco
cafuné
praia à tarde
arroz-feijão-farofa
cantar
sexo
guppies e espadinhas
coque
primavera
Ella, Nina, Bessie, Gal, Esperanza, Zap Mama
calor
saia comprida
Salt Song
poesia
andar a cavalo
simplicidade
crônicas
ser bisneta da Marfiza duas vezes
Amor nos Tempos do Cólera
estar cercada de mulheres fortes e poderosas
conversas interessantes
pessoas inteligentes
homens com coleção de LP
escrever
barulho de chuva
recortar e colar
casa de fazenda
estantes e bibliotecas
massagem
coisas coloridas
contas
colcha de retalhos
quindim
recortes do Matisse
coisas antigas e histórias de famíla
sair pra tomar cerveja
revistas de decoração
roxo e vermelho
a família firinfimfim
papo furado
viajar
meus amigos
intimidade
aprender outras línguas, e a minha
rir
mexerica
amoRRR e gentileza
gostar.

A lista é de 2008, inspirada por uma do Jampa, e é bom ver que de lá pra cá umas coisas mudaram e outras não. Editei bem pouco.

Para ouvir: My Favorite Things

Ela desatinou

Depois que deu pra Deus e todo mundo ficou indiferente. Não apática, só não aferrada à luta cotidiana de seduzir. Ia muito do clima, do dia, do estado de espírito e da época do mês. Por vezes acordava úmida sereia e se demorava a pentear com os braços levantados em frente ao espelho. Outras, era a última mortal, toda útero revirado, tomando banho ajoelhada no chão do boxe, a água fervente a lhe tirar o viço das costas. Ainda assim, é  useiro e vezeiro avistá-la andando pela rua com um sorriso entre bobo e debochado cantando baixo alguma toada antiga, olhando para o chão e ignorando os prédios dos amantes.

Foto: Loris Machado.
Foto: “Zoe e Granato”, por Loris Machado.

Não se assuste pessoa

Hoje estou escrevendo mais que ontem e menos que anteontem. Saudade dessa escrita-umbigo, mais registro e menos conteúdo. Não divertia você, mas me faz chorar até hoje lembrando tempos idos, e olha que metade das vezes nem eu sei do que estava falando.

É claro que não tenho tempo de escrever, porque dá um pusta trabalho ser feliz. Quando a gente tá contente dá preguiça, aparecem as poucas costuras malfeitas, a gente fica planejando o futuro e tentando arrumar gavetas ao mesmo tempo em que tenta se aproximar das pessoas e fazer as coisas que aquela gente feliz faz nas propagandas e nos filmes. Canseira braba.

Quando a vaca tá magra parece que fica mais fácil ter arroubos artísticos, ganhar colo, encontrar os amigos, consertar tudo ali grosso modo porque qualquer melhora é lucro. Mas ó, não tô reclamando não. Não muito.

Para ouvir: Dê um rolê

Achados e Perdidas

Ele: “Eu tinha uma dessas sapateiras transparentes atrás da porta do meu quarto. Era uma época boa, eu morava sozinho… Aí a empregada, sem eu nem perceber, ia catando tudo que as meninas esqueciam lá em casa e colocando num bolso vazio da sapateira. Colares, brincos, coisas desse tipo. Comecei a sair com uma moça que depois virou minha namorada, ela esqueceu o relógio e eu liguei pra avisar. Ela falou: ‘ok, mas não põe ele lá no canto das meninas não, tá?’. Assim foi que eu soube que as mulheres reparam nessas coisas”

Um canalha gentil sempre guarda o que foi esquecido em sua casa, de preferência longe dos olhares curiosos das outras mulheres, sejam elas namoradas, rolinhos, flertes, mãe, irmãs ou tia Candoca. À safada de fino trato fica reservado o direito ao esquecimento por motivos alcóolicos ou de atividade sexual mas jamais, repito, jamais para marcar território. Ela sabe que não precisa desses subterfúgios. Pode ligar para pedir alguma coisa de volta, mas só se tiver clima pra isso e se for alguma coisa mais ou menos importante. E aprende que da próxima vez, né, nega, é pra isso que serve bolsa.

Este post é parte do Manual de Etiqueta Amorosa e Sexual para Canalhas Gentis e Safadas de Fino Trato. Se tiver alguma sugestão de tema, por favor deixe um comentário ou mande um email para maffalda (arroba) gmail (ponto) com.

These boots are made for walking

Por mais carmelita descalça que eu seja, ainda gosto de sapatos. Aquela coisa estereotipicamente feminina: olhar vitrine, achar alguns lindos e outros horrorosos, experimentar e, eventualmente, quando preciso, comprar.

Só um problema: eu, com meus 1,66m de altura, calço 40. Então a coisa não é tão simples assim, porque as lojas nunca têm o meu número e as vendedoras passam rápido da sorrateira olhadela para os meus pés às velhas mentiras “nosso 39 é grande” e “depois alarga”. Isso quando não estou procurando tênis, e ao perguntar pelo 40, ouço “não, esse é feminino!”.

Na casa dos 30 anos e nem tão alta assim, não consigo imaginar quanto calçam as altonas da nova geração. Das minhas 4 amigas que calçam o mesmo número que eu, a Tati mede 1,70m, a Bianca 1,72m,  a Carol 1,73m e a Prill 1,75. Ou seja, eu sou a baixinha dos pés grandes. Minha mãe diz que quando eu era criança ela botava vestidinho em mim e meus pés iam lá na frente, um vexame.

CampusParty 2010-14-2

Ultimamente, entro em lojas de sapatos e pergunto na lata: “sapatos femininos, até que número vocês têm?” Se a resposta for 39, eu me viro e vou embora sem nem uma olhadinha para os modelos disponíveis, que é pra não dar ibope pra comerciante mané.

Meu protesto inócuo, se não chega a configurar desobediência civil, poupa sanidade mental e bastantes dinheiros.

Lojas que vendem sapatos do meu tamanho: Pele Rara, Pontapé, Pé de Anjo, Confortaria, Ferni.

Sua altura e número dos pés nos comentários, por favor. E sugestões de lojas!

Tia Zilah

Meu pai menino veio do interior para o Rio morar com uma tia cujos filhos já estavam crescidos. “Preciso de companhia”, ela disse. Eram todos galalaus e a única moça era a mais velha, metida com políticas. Para o assombro do primo do interior, queimavam-se papéis e livros do Partido Comunista no auge da repressão, com um lençol protegendo o relumejar da chama dos olhares dos vizinhos e a descarga funcionando a noite inteira para se livrar das cinzas. A minha tia Zilah leu os jornais diários e teve uma opinião sobre tudo até anteontem, quando faleceu no Rio, aos 94 anos.  Não encontrei, óbvio, nenhuma prova de que ela tenha sido do Partidão.

Descanse em paz, tia Zilah.

(Mulheres extraordinárias nascem de mulheres extraordinárias.)

Envelheço na cidade

Hoje este blog faz 9 anos.

Quem começou a escrevê-lo foi uma outra Maffalda que achava que já sabia bastante e sempre teve vergonha de escrever diários. O blog registrou minha vida abertamente primeiro, e depois de forma um tanto críptica, e nos últimos três anos muito falhamente. Nunca teve um tema, sempre foi meio umbigo, me rendeu alguns amigos, registrou bons e maus momentos, serviu pra paqueras, tentou não se envolver em celeumas, continua aqui. Não dá pra dizer que a chegada do twitter e do google reader foram legais para o bichinho. Migrei para o wordpress, troquei a bruxa do Nalon pela bruxa do Weno (amo as duas), mas escrever que é bom, ultimamente, necas de pitibiriba. Em parte porque fiquei mais discretinha, sem querer mostrar muito o que faço e o que sinto – contradição enorme, já que no twitter estamos todos nus e de remela.

Conto então que estou bem, morando perto dos pais num apartamento muito pequeno e quase organizado, cada vez mais praticando a tal da simplicidade voluntária, ajudando a organizar uns encontros com os amigos pra ouvir idéias legais, trabalhando num projeto temporário que reúne muita gente bacana e fazendo um curso que apareceu na hora certa. Mesmo estando efetivamente em falta, não me sinto em falta com os amigos e o namorado e os amigos do namorado. Tem uma sensação de encaixe que tem permeado tudo e é muito bem-vinda.

Nos projetos futuros estão alguns posts pra cá que nem prometo mais, como um sobre currículos e um sobre livros, misturando cada vez mais os assuntos. O curso vai render um trabalho final bem bacana sobre bancos de tempo, que eu vou detalhar mais assim que organizar as idéias. Isso vai sair em definitivo lá pra dezembro, mas devo falar bastante sobre o projeto a partir do fim de julho. Quanto ao Simplim, que foi minha empolgação de outrora, estou pensando em matá-lo ou encostá-lo e trazer os posts em definitivo para cá. Um projeto sobre simplicidade está sobrando na minha vida simples! Se alguém tiver idéias para postar lá ou estiver interessado em discutir mais amplamente sobre simplicidade voluntária, estou a postos e de ouvidos abertos.

Em suma, não me deixem só. Pode ser que eu escreva em mais de 140 caracteres de novo.